December 24, 2018
1. INTRODUÇÃO
Durante as férias e festas é muito comum as pessoas
pegarem a estrada para viajar, rever os entes queridos, ir a shows e
eventos; mas você está antenado com as principais teorias da
responsabilidade civil sobre colisão de veículos? Está preparado para
fazer uma boa interpretação jurídica dos fatos acaso uma batida ocorra?
O texto que se segue esclarecesse as teorias mais corriqueiras nos
tribunais. Portanto, desejo boa leitura a todos que se interessarem!
2. PRINCÍPIO DA RESPONSABILIZAÇÃO DO CAUSADOR DIRETO
Na reparação por acidentes de trânsito vige, como regra, o princípio da
responsabilização do causador direto dos danos, ressalvando-se o
regresso contra terceiro causador do perigo ou a aplicação da exclusão
do nexo de causalidade pela teoria dos corpos neutros (que será vista
mais à frente). Portanto, para maioria dos casos, se o acidente se der
por culpa de um causador externo, não se elide automaticamente a
responsabilidade de quem efetivamente colidiu contra o veículo da
vítima. Nesse sentido é a jurisprudência dos Pretórios nacionais, como
nos acórdãos do TJPR, in litteris:
AÇÃO DE RESSARCIMENTO - SEGURADORA - ACIDENTE DE TRÂNSITO - INVASÃO
DE PISTA CONTRÁRIA - ALEGAÇÃO DE FATO DE TERCEIRO, QUE TERIA EFETUADO
MANOBRA DE MARCHA-A-RÉ SOBRE A PISTA - NÃO COMPROVAÇÃO -
RESPONSABILIDADE DO AUTOR DIRETO DO DANO - O FATO DE TERCEIRO NÃO SE
TIPIFICA COMO CAUSA EXCLUDENTE DA RESPONSABILIDADE - AÇÃO JULGADA
PROCEDENTE -DESPROVIMENTO DO RECURSO. "Na responsabilidade civil
domina o princípio da obrigatoriedade do causador direto pela
recuperação em acidente de trânsito. A circunstância de afigurar-se, no
desencadeamento dos fatos, culpa de terceiro, não libera o autor direto
do dano do dever jurídico de indenizar. Na sistemática do direito
brasileiro, artigo 1.520 do Código Civil,
concede-se a ação regressiva em favor do autor do prejuízo, contra
terceiro que criou a situação deperigo, para haver a importância
despendida no ressarcimento do dano"(Arnaldo Rizzardo, in"Reparação nos Acidentes de Veículos, ed. RT, pág. 70,).
(TJPR - 10ª C.Cível - AC - 304278-0 - Cascavel - Rel.: Ronald Schulman - - J. 22.09.2005)
_____________________
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO VISANDO O RESSARCIMENTO
DOS DANOS CAUSADOS EM ACIDENTE DE TRÂNSITO. TESE ACERCA DA DINÂMICA DOS
FATOS ALTERADA EM SEDE RECURSAL, CARACTERIZANDO INOVAÇÃO. RECURSO NÃO
CONHECIDO NESSE PONTO. LITISCONSÓRCIO PASSIVO NECESSÁRIO AFASTADO, POIS O
PREJUDICADO TEM A PRERROGATIVA DE ESCOLHER CONTRA QUEM IRÁ DEMANDAR NA
HIPÓTESE DE EXISTIR MAIS ENVOLVIDOS NO SINISTRO. LASTRO PROBATÓRIO
CONSTANTE NOS AUTOS QUE INDICA O CONDUTOR DEMANDADO COMO CAUSADOR DIRETO
DO DANO. EVENTUAL CULPA DE TERCEIRO A SER DISCUTIDA EM AÇÃO REGRESSIVA. INTELIGÊNCIA DO ARTIGO 930 DO CÓDIGO CIVIL.RECURSO CONHECIDO EM PARTE E, NA EXTENSÃO, DESPROVIDO.
(TJPR - 10ª C.Cível - AC - 1329796-0 - Curitiba - Rel.: Carlos Henrique Licheski Klein - Unânime - - J. 19.05.2016)
Sem destoar, é o entendimento do Tribunal de Justiça de São Paulo:
Responsabilidade Civil – Acidente de trânsito – Colisão em Rodovia –
(Rodovia Fernão Dias) – Alegação de fato de terceiro que, em regra, não
exclui a responsabilidade do causador direto do dano, ressalvado
eventual regresso – - Ingresso inopinado de viatura policial em rodovia
de trânsito rápido – Engavetamento – Ação julgada procedente - Sentença
confirmada. - Recurso desprovido.
(TJSP; Apelação 0010761-39.2013.8.26.0001; Relator (a): Edgard Rosa;
Órgão Julgador: 25ª Câmara de Direito Privado; Foro Regional I - Santana
- 3ª Vara Cível; Data do Julgamento: 10/11/2016; Data de Registro:
11/11/2016)
Assim, o causador direto do dano, na maioria dos casos, será o responsável pela reparação.
3. PRINCÍPIO DO CAUSADOR JURÍDICO OU TEORIA DO CORPO NEUTRO
3. 1. CONCEITO:
Os corpos não demonstram vontade, são incapazes de executar ações
planejadas. Dessa maneira, imagine-se que Tício, em altíssima
velocidade, colida violentamente contra o carro de Caio, este último,
por sua vez, em que pese estar trafegando em conformidade com todas as
normas de trânsito, é arremessado como mero instrumento, e se
choca contra o automóvel de Mévio. No caso em tela, há de se aplicar a
teoria dos corpos neutros para excluir a responsabilidade de Caio
(causador direto do dano) e imputá-la tão somente a Tício (causador
jurídico do dano).
O Tribunal de Justiça de Minas Gerais já conceituou o instituto com maestria:
EMENTA: DIREITO CIVIL - RESPONSABILIDADE CIVIL - ACIDENTE
AUTOMOBILISTICO - CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIRO - AUSÊNCIA DE
COMPORTAMENTO VOLITIVO DO CONDUTOR DO VEICULO ABALROADOR - TEORIA DO
CORPO NEUTRO - RECURSO PROVIDO. A teoria do corpo neutro estabelece uma
aplicação especial do fato de terceiro nos acidentes de trânsito, e
aplica-se quando o agente físico do dano, atingido, sem atuação
voluntária, viola direito de terceiro inocente.
Por consequência, os alegados prejuízos materiais devem ser reparados pelo causador do acidente.
(TJMG - Apelação Cível 1.0245.12.000771-2/001, Relator (a): Des.(a)
Otávio Portes , 16ª CÂMARA CÍVEL, julgamento em 08/11/2017, publicação
da sumula em 22/11/2017)
Em outro aresto, Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul salientou que
não é necessário que o veículo que é lançado como mero instrumento
esteja inicialmente parado para ser aplicada a teoria do corpo neutro. É
a ementa do acórdão:
Ementa: RECURSO INOMINADO. AÇÃO INDENIZATÓRIA. ACIDENTE DE TRÂNSITO.
APLICAÇÃO DA TEORIA DO CORPO NEUTRO A AFASTAR A RESPONSABILIDADE DAS
RÉS. TERCEIRO ENVOLVIDO NO EVENTO, QUE TERIA DADO CAUSA AO ACIDENTE, QUE
NÃO FIGURA COMO PARTE NO PROCESSO. RECURSO DO AUTOR VISANDO A REFORMA
DA SENTENÇA, AFASTANDO A TEORIA DO CORPO NEUTRO. FATO DE O VEÍCULO DO
RÉU NÃO ESTAR PARADO QUE NÃO AFASTA A TEORIA DO CORPO NEUTRO.
INEXISTÊNCIA DE PROVAS DE QUE OS RÉUS CONTRIBUÍRAM NO EVENTO. DECISÃO
RECORRIDA MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO. (TJRS. Recurso Cível Nº
71007831902, Segunda Turma Recursal Cível, Turmas Recursais, Relator:
Ana Cláudia Cachapuz Silva Raabe, Julgado em 26/09/2018)
Assim, ao nosso entender, o acórdão que se deve analisar se houve culpa e conduta intencional daquele que abalroou.
3.2. ÔNUS DA PROVA NA TEORIA DO CORPO NEUTRO
Quem tem interesse jurídico na aplicação da teoria do corpo neutro é o
réu abalroador direto, pois é ele a quem aproveita demonstrar os fatos
impeditivos, modificativos ou extintivos do direito do autor. Deve então
provar que: i) foi lançado como mero instrumento do ilícito de um
terceiro e ii) observou as normas de trânsito, não corroborando de
nenhuma forma para a realização do ilícito.
Por não considerar que houve a comunhão dos requisitos supra, o TJDFT negou aplicabilidade a teoria do corpo neutro, in verbis:
INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS. COLISÃO VEÍCULOS. ENGAVETAMENTO.
TEORIA DO CORPO NEUTRO. INAPLICABILIDADE. PROVAS. EVENTOS SUCESSIVOS E
INDEPENDENTES. DISTÂNCIA DE SEGURANÇA. INOBSERVÂNCIA. RESPONSABILIDADE
SOLIDÁRIA.
1. Segundo a teoria do corpo neutro, o veículo lançado à frente, como
um corpo neutro, não pode ser considerado causador do sinistro e,
portanto, seu condutor exime-se de responsabilidade.
1.2. As provas relacionadas à dinâmica do acidente, a ausência de
impugnação quanto à afirmativa de que ocorreram duas colisões
sucessivas, tornando-a incontroversa, e a demonstração de que o condutor
que primeiro abalroou o carro sinistrado não guardou a distância de
segurança prevista no Código de Trânsito afastam a incidência da teoria
do corpo neutro.
2. O STJ consolidou o entendimento no sentido de ser presumível a
culpa daquele que colide na traseira de outro veículo quando não
demonstrado outros fatores de influência no acidente ou prova em sentido
contrário.
3. De acordo com o art. 265 do Código Civil, a solidariedade não se presume, pois resulta da lei ou da vontade das partes.
4. A ocorrência de duas colisões sucessivas não necessariamente torna
o condutor que por último abalroou o carro sinistrado responsável
solidário para arcar com a reparação das avarias supostamente agravadas
pela segunda colisão, porque o evento anterior afasta a solidariedade e
faz incidir a responsabilidade proporcional decorrente dos danos
causados pelo acidente posterior.
4.1. A ausência de prova pericial para demonstrar o nível de
agravamento das avarias provocadas pelo segundo abalroamento
impossibilita mensurar o grau de responsabilidade e o quantum
indenizatório cabível ao condutor que por último colidiu com o carro
sinistrado.
5. Recursos conhecidos e desprovidos.
(TJDFT. Acórdão n.1041848, 20160110859699APC, Relator: DIAULAS COSTA
RIBEIRO 8ª TURMA CÍVEL, Data de Julgamento: 24/08/2017, Publicado no
DJE: 30/08/2017. Pág.: 352/367)
Isso de dá porque a teoria do causador jurídico (ou do corpo neutro) só
se aplica quando o fato de terceiro exclui nexo causal de maneira tal a
se equiparar ao caso fortuito e a força maior, subtraindo totalmente a
ação do abalroador direto. Nesse aspecto, mister se faz ressaltar as
lições do insigne mestre, SERGIO CAVALIERI FILHO que assevera:
Ressalte-se, uma vez mais, que o fato de terceiro só exclui a
responsabilidade quando rompe o nexo causal entre o agente e o dano
sofrido pela vítima e, por si, só, produz o resultado (...).
Se não obstante o fato de terceiro, a conduta do agente também
concorre para o resultado, já não mais haverá a exclusão de causalidade.
Assim, se o motorista, ao se desviar de uma brusca fechada dada por um
ônibus, sobe na calçada e atropela um transeunte, não poderá invocar o
fato de terceiro para afastar a sua responsabilidade, porque, na
realidade, a causa direta e imediata do atropelamento foi seu próprio
ato (...).
(CAVALIERI FILHO, Sérgio. Programa de Responsabilidade Civil. 11ª edição. São Paulo: Atlas, p. 87-88)
A título de exemplo, em engavetamentos, quem colidir deve comprovar que
estava numa distância segura do veículo à frente. Enfim, não é qualquer
alegação de fato de terceiro que tem o condão para excluir o nexo
causal.
Assim, o direito consegue punir a ação de todos aqueles que contribuíram
para o ilícito, excluindo tão somente os que em nada contribuíram para o
evento danoso.
3.3. CRÍTICA AO POSICIONAMENTO DO DOUTRINADOR CARLOS ROBERTO GONÇALVES: A RESPONSABILIDADE NO TRÂNSITO DEVE SER INTEGRAL?
O doutrinador e desembargador aposentado do TJSP, CARLOS ROBERTO
GONÇALVES comenta sobre a teoria do risco nos acidentes
automobilísticos, defendendo que a imprudência de terceiros não tem o
condão de excluir a responsabilidade do causador direto. É o
entendimento:
Em matéria de responsabilidade civil, no entanto, predomina o
princípio da obrigatoriedade do causador direto em reparar o dano. A
culpa de terceiro não exonera o autor direto do dano do dever jurídico
de indenizar.
O assunto vem regulado nos arts. 929 e 930 do Código Civil,
concedendo o último ação regressiva contra o terceiro que criou a
situação de perigo, para haver a importância despendida no ressarcimento
ao dono da coisa.
(...) Segundo entendimento acolhido na jurisprudência, os
acidentes, inclusive os determinados pela imprudência de terceiros, são
fatos previsíveis e representam um risco que o condutor de automóveis
assume pela só utilização da coisa, não podendo os atos de terceiros
servir de pretexto para eximir o causador do dano do dever de indenizar.
(GONÇALVES, Carlos Roberto. Direito Civil Brasileiro. vol. 4; responsabilidadecivil. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2012, pág. 468.)
Com a devida venia, discordo parcialmente do entendimento do autor em questão, pois os artigos 929 e 930 do CC/02
tratam do caso de estado de necessidade ofensivo, ou seja, daquele em
que para se livrar de mal iminente, alguém sacrifica bem jurídico alheio
de igual ou menor valor do que se quer proteger. Nesse caso, quem
sacrificou o bem alheio deve indenizar e, se quiser,agir de regresso
contra o causador do perigo.
Outra coisa bem diferente é o caso daquele que é arremessado como mero
instrumento, sem fazer escolha nenhuma, ter que indenizar os demais
prejudicados. Ora, mas ele é tão vítima quanto! O fato de o cidadão
imaginar que acidentes de trânsito podem acontecer não o deve obrigar a
ressarcir todos os danos, em todas as hipóteses; sobretudo quando em
nada contribuir para o mal. A teoria do risco não pode tornar o cidadão
comum em pagador universal, sob pena de se aplicar o a teoria da
responsabilidade do risco integral como regra ao brasileiro comum,
quando até mesmo para o poderoso Estado ela é exceção!
3.4. DIFERENÇA ENTRE TEORIA DO CORPO NEUTRO E ESTADO DE NECESSIDADE (OFENSIVO E DEFENSIVO)
Não se deve assim, confundir estado de necessidade com teoria do corpo
neutro. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), em acórdão antigo, já bem
delineou a questão:
DIREITO CIVIL. RESPONSABILIDADE CIVIL. ACIDENTE AUTOMOBILISTICO.
CULPA EXCLUSIVA DE TERCEIRO. AUSENCIA DE COMPORTAMENTO VOLITIVO DO
CONDUTOR DO VEICULO ABALROADOR. INAPLICABILIDADE DOS ARTS. 160, II E 1.520, CC.
HIPOTESE DIVERSA DA APRECIADA NO RESP 18.840-RJ (DJU DE 28.03.94).
DENUNCIAÇÃO DA LIDE. IMPROCEDENCIA DO PEDIDO DEDUZIDO NA AÇÃO PRINCIPAL.
ONUS DA SUCUMBENCIA. PRECLUSÃO. RECURSO DESACOLHIDO.
I - NÃO HA DE ATRIBUIR-SE RESPONSABILIDADE CIVIL AO CONDUTOR DE
VEICULO QUE, ATINGIDO POR OUTRO, DESGOVERNADO, VEM A COLIDIR COM COISA
ALHEIA, PROVOCANDO-LHE DANO, SENDO TAL SITUAÇÃO DIVERSA DAQUELA EM QUE O
CONDUTOR DO VEICULO, AO TENTAR DESVIAR-SE DE ABALROAMENTO, ACABA POR
CAUSAR PREJUIZO A OUTREM.
II - CASO EM TELA, O PREJUIZO EXPERIMENTADO PELO DONO DA COISA
DANIFICADA NÃO GUARDA RELAÇÃO DE CAUSALIDADE COM QUALQUER ATITUDE
VOLITIVA DO REFERIDO CONDUTOR, CUJO VEICULO RESTOU ENVOLVIDO NO ACIDENTE
COMO MERO INSTRUMENTO DA AÇÃO CULPOSA DE TERCEIRO.
III - NOS CASOS EM QUE NÃO OBRIGATORIA A DENUNCIAÇÃO DA LIDE, AO
REU-DENUNCIANTE, UMA VEZ RECONHECIDA A IMPROCEDENCIA DO PEDIDO DEDUZIDO
NA AÇÃO PRINCIPAL, INCUMBE ARCAR COM O PAGAMENTO DA VERBA HONORARIA
DEVIDA A DENUNCIADA E DAS DESPESAS PROCESSUAIS RELATIVAS A LIDE
SECUNDARIA.
(REsp 54.444/SP, Rel. Ministro SÁLVIO DE FIGUEIREDO TEIXEIRA, QUARTA TURMA, julgado em 18/10/1994, DJ 21/11/1994, p. 31776)
O Código Civil deixa claro que estado de necessidade ofensivo é aquele em que uma pessoa escolhe sacrificar um bem alheio (de valor igual ao inferior ao protegido) para livrar-se de um perigo iminente causado por terceiro.
O estado de necessidade defensivo ocorre quando a vítima é quem causa o perigo. Nesse caso, não há indenização.
É a literalidade da norma:
Art. 188. Não constituem atos ilícitos:
I - os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido;
II - a deterioração ou destruição da coisa alheia, ou a lesão a pessoa, a fim de remover perigo iminente.
Parágrafo único. No caso do inciso II, o ato será legítimo somente
quando as circunstâncias o tornarem absolutamente necessário, não
excedendo os limites do indispensável para a remoção do perigo.
Art. 929. Se a pessoa lesada, ou o dono da coisa, no caso do inciso
II do art. 188, não forem culpados do perigo, assistir-lhes-á direito à
indenização do prejuízo que sofreram.
Art. 930. No caso do inciso II do art. 188, se o perigo ocorrer por
culpa de terceiro, contra este terá o autor do dano ação regressiva para
haver a importância que tiver ressarcido ao lesado.
Parágrafo único. A mesma ação competirá contra aquele em defesa de quem se causou o dano (art. 188, inciso I).
O ilustre penalista ROGÉRIO GRECO, com maestria, comenta os efeitos civis do estado de necessidade:
O Código Civil, como se percebe pela redação do art. 188, II,
não considera ilícito o ato daquele que atua em estado de necessidade e
que, por se encontrar diante de uma situação de perigo iminente, vê-se
obrigado a deteriorar ou a destruir a coisa alheia ou produzir lesão a
pessoa a fim de remover este perigo.
Contudo, embora o ato não seja considerado ilícito, como ambos os bens em conflito estão amparados pelo ordenamento jurídico, o Código Civil
permitiu àquele que sofreu com a conduta daquele que agiu em estado de
necessidade obter uma indenização deste último, correspondente ao
prejuízos experimentados.
Na verdade, o legislador civil quer dizer o seguinte: Mesmo que a
conduta do agente que atua em estado de necessidade não seja ilícita,
porque seria uma incongruência o Código Penal considerá-la lícita, enquanto para o Código Civil
seria ilícita, se o terceiro que sofreu com a conduta do agente não
tiver sido o causador da situação de perigo, permanecerá a obrigação de
indenizar os prejuízos causados.
Caso o perigo tenha sido criado por aquele que sofreu o dano, não lhe caberá, aqui, direito a indenização.
(GRECO, Rogério. Curso de Direito Penal: vol. I. 18º ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2016, pg. 441)
Muito diferente daquele que é lançado como mero instrumento contra outrem. O causador direto não fez nenhuma escolha, não há o aspecto volitivo. Daí diz-se que somente o causador jurídico deve indenizar, aplicando-se a teoria do corpo neutro.
4. Síntese conclusiva
Via de regra, a figura do causador direto e jurídico coincidem. E mesmo
que haja mais de um causador, presume-se a responsabilidade solidária
entre eles.
Cabe ao abalroador direto para eximir-se da culpa (as duas primeiras
devem ser conjugadas): a) que foi lançado como um corpo neutro, como
mero instrumento do ilícito de um terceiro; b) que não contribuiu,
assim, para o evento lesivo e reguardou as normas de trânsito ou c) o
perigo foi causado pela suposta vítima (estado de necessidade defensivo)
e/ou culpa é exclusivamente dela (culpa exclusiva da vítima).
Ressaltamos que no caso de estado de necessidade ofensivo, deve-se
indenizar a vítima, mas haverá direito de regresso contra terceiro
causador do perigo.
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