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Thereza Collor se candidata "contra a corrupção" 26 anos após impeachment

UOL



Aos 55 anos, a empresária, historiadora, fotógrafa e colecionadora de arte Thereza Collor tem uma trajetória que não deixa de encontrar paralelo também no ambiente em que ela recebe as visitas – e onde ela falou, na semana passada, com a equipe de reportagem do UOL.
Embora com um discurso centrado na atual pauta de transparência e combate à corrupção, a alagoana é candidata a deputada federal por São Paulo não apenas por um partido vinculado à imagem da velha política, o PSDB, mas com o sobrenome que ainda hoje a associa a um ex-presidente que sofreu impeachment e teve os direitos políticos cassados em meio a um escândalo de corrupção. O "Lyra" que também integra seu sobrenome representa outra antiga oligarquia nordestina: ela é filha do usineiro e ex-deputado federal João Lyra – considerado, no início da década, o parlamentar mais rico do Brasil.
Moradora da capital paulista há 18 anos e casada hoje com o empresário da construção civil Gustavo Halbreich, Thereza explicou por que se lançou candidata só agora, embora seja filiada ao PSDB há duas décadas, e também falou sobre os bastidores da entrevista que o marido, Pedro Collor, concedeu à revista Veja em 1992 a respeito dos esquemas de enriquecimento de Fernando Collor com o auxílio de Paulo César Farias. À época ela foi batizada de "musa do impeachment" e, em 1994, ficou viúva após Pedro não resistir a um tumor agressivo na cabeça.
Ormuzd Alves/Folhapress
Thereza e Pedro Collor em foto de 1992
Hoje, Fernando Collor é senador por Alagoas e candidato ao governo do estado. Ele terá o apoio regional do PSDB, e Thereza lamentou a aliança. "É muito triste para mim, que cortei da própria carne para combater esquemas nefastos para o Brasil, ver meu próprio partido, ao qual estou filiada há 20 anos, se aliar regionalmente a esta candidatura ao governo de Alagoas", afirmou ela em nota nesta terça, avisando que não apoiará o ex-cunhado, mas que compreende a "posição delicada de meu candidato a presidente, Geraldo Alckmin".
Thereza faz questão de dizer que, embora use o sobrenome do primeiro marido e dos filhos de 34 e 31 anos frutos da relação, não tem "relação alguma" com Fernando Collor. E explica por que, então, ainda assina Collor.
"Porque tenho dois filhos com Pedro, de quem fiquei viúva após 14 anos de casada e com quem eu havia me casado muito menina. Depois de tudo que passei com ele, forjou mais ainda essa identidade com 'Collor'. Já viúva, ainda tentei assinar 'Thereza Lyra', mas ninguém se identificava comigo --são 14 anos!", diz. "E depois de uma aparição maciça de mídia, é impossível trocar um nome que ficou muito marcado", justifica.
É um sobrenome que pesa: quando você menciona 'Collor', o primeiro vínculo que vem é com o ex-presidente. Acho que o grande desafio é mostrar essa diferença, principalmente aos jovens
Thereza Collor, candidata a deputada federal
A reportagem quis saber da candidata qual a reação dela ao descobrir que o ex-cunhado se disponibilizara a tentar novamente a Presidência - antes de ser oficializado como candidato ao governo de Alagoas, Collor se lançou como pré-candidato ao Planalto, mas o partido vetou a indicação. "Às vezes você está mais no ostracismo e precisa aparecer para fazer algumas negociações. É um modo de fazer política que eu não admiro e que não tem o meu aval", disse. "Mas eu já achava que já ia ser isso mesmo", completou, sobre a desistência da candidatura.
Raquel Arriola/UOL
Moradora de dois luxuosos apartamentos de 500 metros quadrados cada um em Higienópolis, ela busca os votos da zona leste de SP

Entrada no PSDB e combate à corrupção

Entre uma explicação e outra sobre as centenas de objetos de arte oriundos de povos e localidades como China e Iêmen, Thereza contou que foi pelas mãos do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso e do ex-governador Teotônio Vilela Filho o ingresso dela no PSDB em 1998. FHC, seu vizinho em Higienópolis, seria reeleito naquele ano presidente da República. Teotônio derrotaria o pai de Thereza ao governo de Alagoas em 2006.
"Convites para disputar a eleição [antes da decisão em 2017] nunca faltaram, mas isso nunca havia me passado pela cabeça, até porque eu tinha sido muito desgastada com aquilo", define, sobre o episódio do ex-marido em relação a Collor. "Foi muito pesado e muito solitário enfrentar todo aquele problema não apenas com a família, mas as próprias denúncias... Éramos só eu Pedro, e depois que ele morreu, fiquei sozinha com meus dois filhos e tive de arcar com uma série de ações –as criminais perderam objeto com a morte dele, mas as cíveis prosseguiram".
A "roubalheira" e o "escárnio com a população" usados pela candidata para classificar o mau uso do dinheiro público trazido à tona pela Operação Lava Jato foram os nortes, de acordo com ela, da decisão de entrar mais ativamente na política. E isso foi em 2017 – a Lava Jato completou no último mês de março passado quatro anos de atividades.
Todo mundo reclama, mas pouca gente diz: 'Eu quero trabalhar para mudar isso'. Então eu disse: 'vou sair da minha zona de conforto e entrar nessa guerra'. Porque eu vivi isso
Thereza Collor
"Quando fizemos as denúncias cortando na própria carne, falando de corrupção e roubalheira dentro do governo da família, do cunhado, achei que aquilo ia ser alguma lição para essas classes novas de políticos", relata a alagoana, que foi convidada pelo presidente estadual do PSDB em SP, Pedro Tobias, a se candidatar. "Vou com a cabeça erguida porque não devo, não temo e tenho a minha história", enfatiza.
Thereza vai disputar uma vaga de deputada federal pelo estado de São Paulo, mas definiu o raio de ação à capital e diz que tem andado pela periferia. A escolha foi pela zona leste, região mais populosa da cidade. É que "o eleitor do centro expandido", ela explica, "já sabe bem em quem vota".
"Só quero que saibam que sou candidata e qual a minha proposta. Tenho andado muito toda a periferia de São Paulo e ela não é diferente do centro: as pessoas estão cansadas de corrupção", define.
Raquel Arriola/UOL
Thereza Collor é alagoana, mas está em SP há 18 anos
A reportagem indagou Thereza sobre como ela pretende abordar a temática da corrupção em sua campanha em um partido que viu a própria imagem ser associada a escândalos. Recentemente, o senador Aécio Neves --que desistiu de disputar o Senado e tentará a Câmara --virou réu no STF (Supremo Tribunal Federal) após as delações da J&F. Já o ex-governador e ex-senador Eduardo Azeredo foi condenado e preso pela investigação do mensalão mineiro.
"Acho que a lei tem que ser para todos, não diferencio quem, nem qual partido. E creio até que a justiça, de um modo geral, tem sido muito lenta com relação aos políticos", responde, usando discurso semelhante ao do presidenciável tucano, Geraldo Alckmin. Ela desconversa, porém, sobre a decisão do PSDB de manter Aécio e Azeredo em seus quadros após as denúncias. "Aí é muito mais difícil você falar do coração, da essência do partido; eu realmente nunca participei ativamente do partido, não tenho mandato, e essa é uma questão muito mais interna neles".

Feminismo de "convencimento" e sem "embates"

Thereza Collor não quer mais ser chamada de "musa". Nos anos 1990, estampou todo tipo de capa de revista com a alcunha "musa do impeachment" e tinha os atributos físicos e o modelito muito mais enaltecidos que, necessariamente, suas posições políticas.
"Naquele momento foi muito bacana e lisonjeador ter esse 'musa' e tal, mas hoje estou em outro momento da vida. Quero ser vista não só como musa – fiz tanta coisa em Alagoas, trabalhei tanto, e aí fica um carimbo", lamenta ela, que chegou a ter um cargo na Secretaria de Turismo do Estado. "Mas eu entendo: a gente tem uma sociedade muito machista, é difícil que isso mude assim tão rápido".
Raquel Arriola/UOL
À época batizada de "musa do impeachment", hoje ela quer ser conhecida pelas propostas políticas
O machismo, aliás, veio já da criação – em uma casa em que fora criada para não trabalhar e onde o pai não dava atenção, explicou, quando o assunto eram os convites para disputar cargos públicos. Um desses, feito a Thereza por Teotônio Vilela, foi para tentar o Senado. "É muito difícil para o homem ter na cabeça que a mulher possa ser a sucessora. Fica aquela coisa de 'ah, vamos dar ouvido a ela. Deixa ela falar', sabe?"
A candidata diz que pretende aumentar a representatividade feminina na política –segundo a ONU (Organização das Nações Unidas), o Brasil é o terceiro país mais desequilibrado nesse aspecto, em toda a América Latina --, mas avisa que não fará isso pelo embate.
"A gente pode ir chegando de uma maneira muito mais inteligente. Não gritando, nem batendo de frente: temos habilidade e capacidade para chegar pela competência", discursa. "Minha avó foi uma mulher muito fora de seu tempo, fortíssima. Acho que cada um tem sua forma de lutar e aparecer, como na política. Acredito no poder do convencimento, não tanto no do embate. Eu vivi embates e sei o que isso nos desgasta."
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